Existem experiências na vida que, somente quem passou por elas, é capaz de avaliar a intensidade de alegria ou sofrimento que elas causam.
O exemplo atávico dessas experiências é o nascimento de um filho. Apesar de eu não ter filhos, sei que é um divisor de águas na vida de qualquer ser humano.
A minha experiência mais intensa foi conviver durante muito tempo com a Síndrome do Pânico. E, a exemplo do nascimento de um filho, só quem vivenciou é que pode – e tem o direito – de avaliar o que é. Sim, pois quem nunca passou pelos sintomas e restrições que esse quadro oferece, costuma minimizar o sofrimento de quem é portador desse transtorno.
Alguns dizem que é frescura, outros acham que com "força de vontade" a pessoa conseguiria superar suas dificuldades causadas pela doença. Muita gente já me falou que o pânico nada mais é do que uma maneira de "chamar a atenção", carência e outra mer*&#@ .
Eu tinha 7 anos de idade quando os primeiros sintomas se manifestaram. Imagine isso, na década de 70, quando todo e qualquer comportamento fora do normal era considerado doença mental, loucura.
Seria eu louca? Eu tinha tanto medo do meu medo, que não compartilhava com outros o que eu sentia, a não ser meus pais. E estes, por desconhecimento, achavam que era frescura mesmo. Eu ainda levava bronca e era tratada com desdém quando manifestava meu medo de ficar sozinha, meu medo de morrer ou medo do medo...
Felizmente, com o passar dos anos, essa angústia foi diminuindo e inexplicavelmente o pânico foi se aquietando. Mas ele estava latente... na minha adolescência, aos 15 anos, ele voltou. A crise da adolescência misturou-se ao transtorno do pânico, mas eu pude compartilhar minhas angústias com algumas poucas amigas. Descobri que elas, também, tinham alguns medos inexplicáveis, apesar de se manifestarem em uma proporção infinitamente menor do que os meus. Mas essa descoberta aliviou o meu maior pavor: o de eu não ser uma pessoa normal, de ser portadora de uma loucura que eu deveria disfarçar e esconder das pessoas, para poder ser aceita.
Passado o auge da adolescência, novamente e milagrosamente, o meu transtorno regrediu e foi justamente na fase em que eu ingressei na faculdade de Direito. Aos 17 anos eu fui aprovada nas 3 melhores faculdades de Direito de São Paulo. Obviamente, escolhi a Faculdade de Direito Universidade de São Paulo, conhecida como São Francisco. Foi um sonho realizado e um banho de auto-estima.
Nesse período, que durou 5 anos, a vida resolveu me dar uma folga e disse: vá ser feliz! Eu aproveitei, viajei, namorei, me apaixonei, fui livre como eu sempre sonhei ser. Trabalhava, tinha meu dinheiro, estudava à noite, já era dona do meu nariz.
Ao final dos anos 80, o pânico voltou. Eu estava dirigindo em uma estrada, sozinha, rumo ao litoral. No meio do caminho, ele voltou. Fiquei apavorada no meio do nada, longe da cidade, sentido-me frágil, insegura, sozinha, sem opção a não ser seguir em frente ou voltar.
Estava instalado o medo de viajar sozinha. A primeira limitação que surgiu. E outras vieram em sequência: medo de lugares fechados (ir ao cinema passou a ser uma tortura), medo de ficar presa no trânsito, estar longe de casa, qualquer situação na qual eu não pudesse fugir, no momento em que eu desejasse. Na cerimônia do meu casamento, rezei o tempo todo para que não me desse uma crise e eu tivesse que sair correndo do altar.
E não precisava ser um lugar fechado, bastava eu me sentir em uma situação na qual eu não conseguiria sair do local sem chamar a atenção das pessoas.
Na época eu dava aula, meu coração ficava disparado o tempo todo, com medo de me dar um piti e eu ter de sair da sala – o que pensariam os alunos??
O cérebro começa a pensar em mil coisas, parece que ele é seu pior inimigo, que está te sacaneando 24 horas por dia! Sim, pois muitas pessoas têm crises de pânico quando estão dormindo!
Procurei médicos, terapeutas, na sua maioria profissionais despreparados, alguns picaretas.
A primeira psicóloga que eu procurei quis me tratar com Florais de Bach. Talvez isso possa funcionar quando o paciente está um pouco ansioso, mas, definitivamente, jamais deve ser considerado um tratamento para um paciente que apresenta sintomas severos de Transtorno do Pânico.
Sou totalmente contra profissionais que usam tratamentos alternativos para tratar doenças sérias e debilitantes e tenho motivos para assim pensar.
Por isso, digo com conhecimento de causa: quando alguém tem uma doença, deve procurar um médico sério e deixar essas terapias alternativas apenas como um complemento ao tratamento médico. Perdi tempo, dinheiro e, principalmente, perdi a fé de um dia me curar, depois de passar por pelo menos uns 10 profissionais, entre médicos, psicólogos, sem resultado.
Cheguei a um ponto em que meu transtorno de pânico tornou minha vida um inferno, eu já não conseguia sair de casa, tinha medo praticamente o dia todo,com aquela sensação de algo muito ruim iria acontecer no próximo instante, não conseguia trabalhar. Eu estava no fundo do poço. Só tinha forças para mais uma tentativa.
Descobri um site na internet, em 2003. Comecei a ler os relatos dos pacientes, as respostas do médico responsável pelo site, descobri que o que eu sentia era igual ao que milhares de outras pessoas sentiam, também.
Descobri que o Transtorno do Pânico é uma doença, assim como o diabetes, as doenças na tireóide, enfim... é uma doença física, cujos sintomas são psíquicos.
O cérebro é um órgão como outro qualquer do corpo humano, porém, quando existe algum problema funcional no cérebro, ao invés de se sentir dor, inchaço, febre, ou qualquer outro sintoma físico, o nosso psicológico é que apresenta alterações.
Os pensamentos ficam desordenados, e causam um tremendo mal estar. Tudo isso causado por um DESEQUILÍBRIO DOS NEUROTRANSMISSORES.
O melhor de tudo: isso tem cura – ou, na pior das hipóteses, tem tratamento que controla todos esses sintomas desagradáveis.
Existe um indevido preconceito em relação aos medicamentos para tratar muitas dessas doenças. Muitos erroneamente acreditam que os antidepressivos são remédios perigosos, que causam dependência e deixarão a pessoa "grogue", diferente do seu estado normal.
ERRADO! Os antidepressivos não causam dependência, não da forma que os benzodiazepínicos causam (os famosos calmantes). Os antidepressivos têm a função de normalizar os níveis de neurotransmissores do cérebro. Assim como a insulina normaliza a glicose no sangue.
Os antidepressivos de última geração praticamente não apresentam efeitos colaterais, eu faço uso há 8 anos do mesmo medicamento, minha médica monitora todas as minhas funções orgânicas por meio de exames anuais completos. Faço exames para avaliar fígado, estômago, coração, rins, enfim, check up geral, os medicamentos não causam nenhuma alteração fisiológica no meu organismo.
O único sintoma que eu tive foi uma melhora considerável no meu humor, na libido, na ansiedade.
No meu caso, devido à demora em buscar um tratamento adequado (foram mais de 10 anos), o transtorno do pânico se tornou crônico, por isso, provavelmente terei de tomar remédio por muito tempo, mas eu convivo perfeitamente bem com isso. Não tenho sintomas, ainda evito certas situações (avião, lugares fechados), mas minha qualidade de vida melhorou 99%.
Eu cresci e amadureci com essa doença. Passei a ser tolerante com as dificuldades dos outros. Tornei-me mais forte – não é fácil conviver com os sintomas, exigia de mim força e determinação para não deixar a peteca cair!
Resolvi deixar aqui este relato, para ajudar pessoas que sofrem com TOC, depressão, transtorno bipolar, ansiedade e outras doenças que se tornam cada vez mais comuns em nossos dias.
Ali você encontrará explicações sobre vários transtornos, relatos de pessoas e seus familiares que convivem com essas doenças, informações a respeito de tratamentos, medicamentos e, acima de tudo, espero que as pessoas encontrem ali a esperança que eu encontrei. Foi por meio deste site que eu conheci minha médica, a quem eu agradeço todos os dias por ter me ajudado a voltar a viver.